Susana Chiocca e Pedro André

De improviso, em vésperas do 25 de abril de 2022, a artista multidisciplinar Susana Chiocca (n. 1974) desafiou o músico Pedro André (n. 1983) para uma performance que deveria ocorrer no dia seguinte, no âmbito do evento “Sopa de Pedra”, organizado pelo Café Candelabro. E assim se fez. Sinónimo das coisas que estão vivas, as sonoridades analógicas criadas pelo artista sonoro e visual Pedro André, na circunstância assentes na improvisação, convergiram com a leitura performática de textos escritos por mulheres, realizada por Chiocca. Essa foi a base conceptual para Ensaio aberto, o projeto musical-performativo que agora se apresenta no auditório do Fórum: a música produzida por André desenvolve-se em processos simultâneos de harmonia e dissonância com os textos mais ou menos poético-literários, mais ou menos políticos, mais ou menos provocatórios, selecionados por Chiocca para este momento performático, de autoras como Djiaimilia Pereira de Almeida, Olga Novo ou Cláudia R. Sampaio. Sem ensaios, sem rede. Simplesmente fazendo acontecer. Esta prática próxima da spoken word não é alheia ao modus faciendi de Chiocca, artista e performer que se vem afirmando nas últimas duas décadas. Desde logo, com o projeto incontornável Bitcho, essa “figura ambígua, meio ancestral com um híbrido folk, que dá corpo a um animal feminino”. O bitcho múltiplo e livre que é, de alguma forma, epítome do trabalho da artista. Pedro André é, desde 2020, compositor residente do Museu da Cidade do Porto e participa, frequentemente, como artista sonoro em projetos colaborativos de artes plásticas e performativas.

Texto de Carla Santos Carvalho

Filipa Valente

O projeto de Filipa Valente (n. 1999) Campos Magnéticos: Rede informal de espaços geridos por artistas no Porto, entre 1999 e 2022, propõe-se analisar criticamente “a problemática da relação entre a prática curatorial independente autogerida por artistas e o contexto expositivo institucional e respetiva legitimação simbólica”. A artista/investigadora e curadora identificou e mapeou os espaços geridos por artistas na cidade do Porto nas últimas décadas, ao mesmo tempo que foi registando o percurso dos artistas que por aí passaram e, por maioria de razão, observando a cidade enquanto ser vivo em permanente mutação. O resultado dessa investigação desdobra-se em múltiplas plataformas. Desde logo, num site “arquivo-vivo”, cujo propósito se enuncia a três níveis: identificar, documentar e divulgar. A participação de Filipa Valente nesta Bienal ocorre em duas dimensões: uma delas relacionada com a investigação Campos Magnéticos, primeiro em formato expositivo de representação gráfica da investigação, mas também em vídeo, email arte e uma publicação (no caso, o mapa resultante do projeto que permite ao espetador uma deriva pela cidade, fazendo o reconhecimento dos espaços mencionados); e, igualmente, na vertente residência artística, no âmbito da qual recorre a técnicas artesanais ancestrais como o ponto de Arraiolos, o bordado ou a tecelagem como forma de representação de espécies da fauna e flora lusitânica, para desenvolver um projeto que reflete sobre uma questão bem contemporânea, a problemática dos ecossistemas ameaçados, como consequência da ação humana. Como o curador José Maia gosta de afirmar, o trabalho de Filipa Valente presente nesta BACM “tal como a pista de dança [espaço central desta edição], é uma utopia realizável”. 

Texto de Carla Santos Carvalho