Miguel Ângelo Marques

Se é verdade que é recorrente um artista ir construindo o seu arquivo pessoal imagético – veja-se como ainda recentemente foram descobertos dois cadernos de desenhos de viagens, de Eugène Delacroix, que desvelam a influência desses esboços e anotações no processo de trabalho do pintor oitocentista francês11. Eugène Delacroix, Journey to the Maghreb and Andalusia, 1832: The travel notebooks and other writings, trad. Michèle Hannoosh, (Pennsylvania, Penn State University Press, 2019). – é também certo que a importância desse arquivo se manifesta de modo diferenciado nas práticas artísticas. No caso de Miguel Ângelo Marques (n. 1994), artista cujo corpus de trabalho assenta na pesquisa de relações entre imagem e signo, esse arquivo, no caso constituído por um vasto reportório imagético pessoal e coletivo, intimamente ligado à noção de memória, assume particular relevância. É a partir dele que constrói as suas narrativas visuais, fundamentalmente através da pintura, mas também com recurso a outros meios como sejam o vídeo, a gravura ou a escultura. É esse, aliás, o caso da sua participação na Bienal. Partindo de uma investigação histórico-sociológica do território maiato – os característicos bordados, as gravuras medievais em pedra ou as icónicas gravuras neolíticas/calcolíticas de Ardegães, entre outros – expande o seu acervo de imagens e a partir dele produz novas pinturas e os baixos-relevos que se apresentam nesta mostra, a que se juntam trabalhos anteriores. Uma menção ao dispositivo expositivo escolhido para exibir os trabalhos de Marques: grandes painéis de dupla face, em que as obras se dispõem em conjuntos, sugerindo leituras individuais e, simultaneamente, coletivas e que, do ponto de vista formal, nos trazem reminiscências do Bilderatlas mnemosyne (1924-29) de Aby Warburg. Tendo em mente o conceito de partilha e das suas possibilidades enquanto instrumento de transformação, denominador comum de todo este certame, Miguel Ângelo Marques orienta uma oficina de desenho destinada a crianças do 1º ciclo.

Texto de Carla Santos Carvalho