No princípio era o Bonfim. É nessa freguesia portuense que, em 2018, Fabrizio Matos (n. 1975) e Israel Pimenta (n. 1972) criam o projeto artístico Pedra no Rim. É a partir desse território que desenvolvem uma prática artística peripatética, de reconhecimento e fixação em imagens fotográficas de despojos, de lixo, de objetos encontrados, se se quiser, de naturezas mortas, que são posteriormente materializados em esculturas de cerâmica, constituindo-se como uma espécie de memória do lugar, uma tentativa de contrariar a diluição identitária em curso em alguns bairros da cidade. Uma memória necessariamente sociopolítica, que vagueia entre o belo e o grotesco, salpicada por uma dose de humor e a que não será alheia uma certa aura de mistério. Há nesta dupla artística um cuidado no fazer que replica um cuidado com o lugar, com a vizinhança, com o outro e, por extensão, com o mundo.
É também esse trabalho de desvelamento, de revelação do que está escondido ou esquecido, que agora se apresenta na Bienal da Maia. A alguns objetos trazidos da experiência do Bonfim, somam-se novos trabalhos. Pondo em prática a mesma metodologia usada no Porto, expande-se aqui o campo de pesquisa, adicionando-se novas imagens ao arquivo fotográfico que alimenta o acervo in progress das obras tridimensionais que constituem o projeto Pedra no Rim.
Se no início era o Bonfim, hoje o campo de ação estende-se a outros territórios, alargando-se esse arquivo, que é, num certo sentido, um arquivo do humano.
Texto de Carla Santos Carvalho